Gosto da conversa pequena que tenho com os comerciantes no centro. Mas hoje de manhã, depois da noite ruim, queria apenas ouvir minhas playlists (lindas e até menos óbvias que a de Perfect Days, posso garantir) enquanto comprava o necessário para o dia.
Usava o fone de ouvido quando começou uma conversa áspera entre o chaveiro e um freguês. Só via os rostos e esperava minha vez, cantarolando no modo lipsync. Quando me aproximei do quiosque, o chaveiro Erasmo, baixinho, cheinho, olhinho espantado e cara de bom, virou-se para me dizer:
– Tá todo mundo contra o Lula.
Aiai. Sem trégua pra mim. O que a loka esperava? Tiro o fone.
– Por que contra o Lula?
E o chaveiro só abaixando o rosto, sem falar, talvez temendo que eu fosse uma daquelas. Daí perguntei logo, para economizar tempo:
– Todos estão contra o que ele disse sobre Israel?
Erasmo:
– Sim, todos falam bem de Israel, de deus.
E eu:
– E o que Lula falou de errado? Ele tá muito certo, amigo. Que deus iria aprovar a matança de crianças?
E ele:
– De crianças e de mulheres!
– Pois então.
– Olhe, senhora, a foto do meu filho.
– Muito parecido com você!
– Então, esse é meu filho! Eu ia lá querer que jogassem bomba nele?
– Nunca!
– As crianças de lá estão tatuando os nomes nos bracinhos…
– Horror. – Quase estendi o assunto, tamanha minha indignação benjaminiana, acompanhada de choro, mas preferi cortar caminho: – Sabe o que o Brasil perde financeiramente se as relações com Israel forem rompidas?
E Erasmo sem responder, na mudez do início, o mesmo olhinho de susto.
– Nada! – eu disse. – As pessoas precisam se informar mais. Esquecer a Globo, esquecer o zap. Não vamos confiar em gente burra, vamos? (A cara do Jorge Pontual todinha na minha frente.)
– Vamos não!
E depois reclamam quando eu falo mal de jornalista. Que vergonha, e não só do Pontual, certamente. Caio Blinder, Demetrio Magnoli, conheci bem de perto esses lambe-botas caras de pau. Destroem o Brasil de boa quando é preciso manter suas vidinhas de hienas majestosas no reino do Scar. Um em Nova York, outro na Vila Madalena, ajustando o implante capilar. Vocês já perderam, seus pulhas.