
O título diz bastante. Mas a gente sempre espera que diga mais. “A garota da agulha”, candidato ao Oscar de melhor filme internacional de 2025, escolheu dizer menos.
Menos, ou uma coisa só.
A dor da opressão.
Trabalhado a partir da concepção geral de um thriller, o filme dinamarquês dirigido por Magnus Von Horn, de 41 anos, acaba por se desenvolver como uma dramaturgia de telenovela em torno dos excluídos no início do século 20. Os closes dialogam sob um filtro instagramático em preto e branco, evocando tanto o início comercial da fotografia quanto a explosão industrial que acumulou o proletariado em becos úmidos.
O filme se passa logo após a Primeira Guerra, inspirado em um fato real a envolver uma mulher que acolhia bebês abandonados. A fotografia parece em muitos momentos citar as imagens pioneiras do alemão August Sander (1867-1964), que retratava trabalhadores e outsiders como personagens centrais, a contrastar com a barbárie em torno.
Em fotografia, não há sombras que não possam ser iluminadas, dizia August Sander. E Von Horn segue seus princípios. Ele leva uma luz estruturada e nítida também sobre as ruas estreitas nas quais pelejavam os operários escravizados da indústria têxtil e os homens do circo.
Neste cenário de espetáculo, uma jovem operária se apaixona pelo dono de fábrica que a rejeita quando engravida. Tudo piora mais e mais para ela, seu desespero embebido em éter, sem que nós, os espectadores, conheçamos os subtons de humor que poderiam alternar-se com os da dor constante. Talvez a mudança ritmada de climas ajudasse a temperar o mistério, à moda do que acontece em filmes de mestres do gênero, como Roman Polanski. (Nada de “O inquilino” por aqui.)
A “garota da agulha” (assim chamada, entre outras razões, porque trabalha com costura na linha de produção) vai arrumar emprego com uma senhora que anuncia mediar bebês rejeitados a novas famílias – e já suspeitamos por onde, ali, habita um novo terror. Os atores, até os infantis, parecem ter muitos recursos para entrelaçar esse mote. A narrativa é que vai usá-los acentuadamente numa só direção.
O problema aqui parece ser mesmo essa iluminação constante, a busca desesperada por clareza, quando a atmosfera histórica retratada era turva, a ponto de um diretor como W. H. Murnau (1888-1931) tê-la explorado tão bem sob as sombras.