
POR TYLER MALONE, do LA Times
O diretor de cinema John Waters, 76, lança nos EUA “Liarmouth – A Feel-Bad Romance”. Embora seja seu primeiro romance, Waters escreveu quase tantos livros quanto filmes – incluindo os best-sellers nos Estados Unidos “Role Models”, “Carsick” e “Mr. Know-it-All”. Ele diz que sempre se considerou um escritor em primeiro lugar – e um ávido leitor também. Colecionador de livros desde os 14 anos, tem mais de 11 mil espalhados por suas casas em Baltimore, Nova York e São Francisco.
O romance de Waters está cheio de personagens selvagens e reviravoltas chocantes – lifting facial de animais de estimação, cultos de trampolins, um falo falante – mas a primeira ideia que lhe ocorreu foi uma mulher que roubava bagagem em aeroportos. “Alto conceito”, ele diz. “Estou acostumado com a indústria cinematográfica, então sempre preciso de um título e uma descrição em uma frase.”
As façanhas de Marsha Sprinkle – ladra de malas, vigarista, mentirosa inveterada – poderia ter sido um filme. Ela e os outros dramatis personae de “Liarmouth” parecem ter acabado de sair de um roteiro de Waters; a narrativa entrelaça as perspectivas em diferentes locais de uma maneira que se assemelha a um corte transversal cinematográfico.
Em entrevista ao “LA Times”, o cineasta explica o significado da dita “moralidade perversa” presente em toda a sua obra, nesta também:
“Existem regras no meu mundo. As pessoas certas vencem: aquelas que acreditam em si mesmas, que exageram o que os outros podem pensar que é errado, que aceitam e não se importam com o que os outros dizem, mas não são críticos ou ciumentos. As outras pessoas imitam-se, são amargas, julgam outras pessoas, tentam agir como ricas – quando os ricos de verdade escondem que são ricos.”
Um dos maiores pecados no mundo de Waters é se levar muito a sério. Com os defensores do “politicamente correto”, ele expressa principalmente solidariedade, mas a “justiça própria” é a única coisa com a qual não concorda. “Usávamos humor para lutar quando eu era jovem.”
E acrescenta: “Nós nos revoltamos pela liberdade de expressão!” Ele ainda a mantém como um princípio absoluto, mesmo quando isso o coloca na mira de seus compatriotas mais à esquerda. Ele parece legitimamente preocupado com o fato de os estadunidenses ficarem cada vez mais isolados, cada vez mais falando apenas com pessoas com quem já concordam.
É por isso que ele lê jornais conservadores: recentemente foi ao programa de Greg Gutfeld na Fox News e se tornou amigo – entre todas as pessoas no mundo – de Andrew Breitbart, o falecido provocador de direita.
Breitbart, após uma gravação de “Real Time With Bill Maher”, disse a Waters: “Sou igual a você; aprendemos tudo com Abbie Hoffman. Estamos apenas em lados diferentes. É tudo showbiz.” Waters gosta de entrar no que chama de “território inimigo” porque acha importante “fazer o outro rir, que é a maneira de fazer o outro ouvir”.
Peço sua opinião sobre o julgamento de difamação envolvendo Johnny Depp e Amber Heard. Ele o compara a um filme de Douglas Sirk. Tudo o que ele dirá diretamente é: “Só conheço Johnny de quando ele estava com Winona Ryder, Kate Moss e Vanessa Paradis. Todos esses casamentos terminaram, e as três ex-mulheres dizem coisas boas sobre ele agora. Eu nunca vi ele ser horrível com uma mulher.”
Que tal trabalhar com Woody Allen? “Foi ótimo. E não devolvi o dinheiro. Eu gastei.” Ele trabalharia com o cineasta novamente? “Não sei, mas paguei para ver os dois últimos filmes dele.” Waters não acredita em “cancelar” pessoas porque “a maioria dos artistas seria cancelada”. Ele acrescenta: “Eu perdoei gente que cometeu assassinato, então não estou julgando ninguém”. Waters fala sério: ele é amigo da ex-integrante da “família” de Manson Leslie Van Houten e lamenta aquela que considera a prisão “ilegal” da protagonista de “Cry-Baby” Amy Locane por dirigir embriagada e causar uma morte.
Waters sente-se bem até o momento com o governo Biden, embora Obama seja seu favorito. “Mesmo que Michelle Obama tenha me vencido no Grammy de melhor álbum narrativo. Todo aquele lobby que ela fez!” Ele se sente um “patriótico low profile”. E confessa: “Acho que os Estados Unidos são os melhores do mundo. Só não fico dizendo isso por aí. Em que outros lugares eu poderia ter tido essa carreira? Em muitos, certamente não.”