Amo São Paulo. Mas a amo vazia.
Não sei negar conversa e me arrepio. Ainda não digeri o que me disseram hoje de manhã na hidro do Sesc. Do Sesc, bem entendido, não do Clube Pinheiros. Mais ou menos isto:
“Estamos num mato sem cachorro. Fodidos. Deveríamos tirar Lula já, mas não fazemos isso porque somos acomodados. Os noias não devem ser alimentados por nós, porque se acostumam mal. Eles agem em quadrilha. Eles estão chegando em Santa Cecília. As tendas! Precisava pegar esse povo da Cracolândia e colocar numa casa. E quem quisesse se matasse lá. Lula só viaja. Foi vaiado em Portugal. E levou sindicalista e sem-terra na comitiva. Agora vai cobrar imposto sindical na aposentadoria. Se ainda tivermos aposentadoria! Essa história de o Brasil se meter na guerra da Ucrânia não dá pra acreditar. Bolsonaro deu azar porque teve a pandemia no meio.”
De noite, no ônibus, não tenho coragem de expulsar do meu lado no banco o homem preto bonito, todo vestido e totalmente bêbado, com aquela bebedeira sem fim nem começo, que insiste em me apertar pelos olhos, mesmo estando eu a escutar música pelo enorme fone de ouvido vermelho, com o rosto voltado pra janela. Acha que sou alguém muito conhecida dele e não se conforma. Deixo ele falar o quanto quer. É uma fala adoecida pelo mundo, não aquela da manhã na hidro, pra adoecer.
Amo São Paulo vazia. Que a imaginação nos crie.
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Difícil digerir mesmo, e vai ser assim por uns anos…
Muito bonita de ler essa última parte. Parabéns!
E viva SP!
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