
“Afinal, em que esses homens estúpidos, cruéis, preguiçosos, desonestos são melhores que os mujiques bêbados e supersticiosos, ou melhores que os animais, também desvairados quando um acontecimento qualquer rompe a monotonia de suas vidas limitadas pelos instintos? Lembro-me de cães torturados até a morte ou enlouquecidos; pardais depenados vivos por garotos e em seguida atirados à água; toda uma longa, enorme lista de lentos e miúdos sofrimentos que pude observar nesta cidade desde a infância. E não cheguei a entender como vivem seus sessenta mil habitantes, por que leem o Evangelho, por que rezam, por que leem livros e revistas. De que lhes adianta tudo o que foi escrito e dito até agora se as mesmas trevas continuam em suas almas e se o seu desprezo pela liberdade é tão grande quanto há cem ou trezentos anos?”
Tchecov em “Minha Vida” (1896), citado em “Tchekhov”, de Sophie Laffitte, trad. Hélio Pólvora, ed. José Olympio, 1993, pag. 139