Estava na hora de a chatice dar o ar da graça na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

mexicano sangue quente:
os estereótipos fazem a festa
“A cozinha” não é um filme sobre cozinha. Duro dizer isso, mas não é. Em alguns momentos, enquanto assistia a minha sessão no Reserva Cultural, um cinema do Jardins paulistano, me perguntava por que o diretor mexicano Alonso Ruizpalacios, de 46 anos, não havia usado seu terceiro longa para cair matando sobre o gosto culinário decadentista do burguês. Ettore Scola já havia dado a dica em “Hostaria!”, maravilhoso episódio do filme “Os Novos Monstros” (1977) onde tudo acaba… em farinha. Mas assim não foi.
Ruizpalacios trabalhou o roteiro a partir de uma peça de Arnold Wesker que desconheço. Preferiu, em lugar de falar sobre cozinha, fazer um filme sobre cozinheiros. Partidos de todas as nacionalidades subjugadas – marroquina, mexicana, preta do Brooklyn – a restar emparedadas na Estátua da Liberdade, que os renegou às estações de comida de um restaurante fast food, eles não têm histórias no filme, mas estereótipos. Os mexicanos são esquentados, machistas como convém. O patrão sádico é o senhor Rashid. E a estadunidense do filme, a garçonete loira disputada por todos os homens, interpretada por Rooney Mara, pede a seu amante, o cozinheiro Pedro (Raúl Briones), que fale com ela eroticamente em espanhol. Foi a parte do filme que me fez rir.
Overreacting. Todo mundo se inerva demais, grita demais, fala demais, colocando as entranhas (hum) para fora quando menos se espera. Não há clímax. Não há ritmo. Tudo é pequeno e já é muito. Um gesto bruto corresponde a uma tragada intensa, que vai resultar num prato quebrado, seguido de uma cuspida no chão, uma estante de alumínio amassada com soco e o bater das mãos acoplado a uma risada mortal (um detalhe é que Rooney Mara vem a ser a esposa de Joaquín Phoenix, bastante conhecido por seu papel como Coringa).
Há também o famoso aborto traumático, não assimilado pelo latino que quer ser pai e pela grávida que sangra no pós-clínica. Mas é melhor eu não me estender nas objeções. Na sessão a que compareci, os espectadores aplaudiram ao final. Porém, me pergunto de que adianta filmar para não fluir. Um filme que não pensa nos encadeamentos nem nas falas, em que os atores trabalham cada um por si e em que a fotografia, a maioria em PB (fica azul numa sequência no frigorífico), parece filtro, não arquitetura. Fazer um filme chato pra quê?

Sessão no Espaço Augusta 1 (21h10 do dia 29)