Três horas da tarde na Paulista e todos haviam desistido.
O sol não voltava atrás.
Refrescar-se, particularmente, só na longínqua e rebelde lembrança dos temporais.
O caminho para o supermercado Pão de Açúcar passava pela drogaria Onofre, para onde eu iria depois.
Mas eis que nesse rumo entre a farmácia e o mercado eu deparava com ela, solitária a três, num canto de sombra, na parte inferior de um muro.
O olfato de seu cachorro, crescido nos últimos tempos, parecia aos berros…
E Ana Isabele, fora do carrinho, junto à mãe, sentada a seu lado no chão, balançava.
Isabele que eu não conhecia, filha nova…
Quando agarrou-se à garrafa de plástico, porque parecia necessário apoiar-se nela, a criança de cinco meses sorriu pra mim.
Ana Isabele tinha nome de princesa.
Viva, esperta.
Ana e Isabel.
E sua mãe, Vitória, era a rainha.
“A Ana Isabele não puxou a minha inteligência, ainda bem, mas a do pai.”
Vitória cria a menina e seu irmão Felipe fazendo-os acreditar que nasceram da mesma desesperança, do mesmo pai.
Um trabalhador da rua, contudo, que sempre estará interessado nele.
Felipe nunca vai ser informado de que seu pai é diferente daquele de Isabele.
“Nem vai perceber.”
Vitória sabe o que faz.
Sentada, olha seus bíceps.
Eu me aproximo mais e lhe dou um litro de leite e bolachas, sempre certa de que dou pouco a quem precisa.
Nem abre o pacote.
Vitória está feliz.
O marido passa pela avenida Paulista vendendo pano de prato.
Ana Isabele sorri porque a adversidade nada lhe diz.
O sol queima o plástico da garrafa, como na vida, quando nos pressionam e machucam até que não suportemos.
Mas o brilho na superfície chama a atenção de quem se interessar.
Ficamos aqui sentados neste chão que ferve um pouco mais, na esperança de que alguém apareça.
Só um pouco mais.