Me emocionei demais com o professor de bicicleta, sob a chuva, entregando as tarefas a seu aluno na periferia pernambucana (leia reportagem aqui). Nunca tive um professor assim.
Durante a infância morávamos no Bixiga, perto das malocas saudosas. Éramos periferia no centro. Estudávamos como bolsistas em um colégio pago porque o Caetano de Campos, a escola pública mais bem reputada da região, não nos aceitou.
Eu sentia uma grande solidariedade em relação aos meus vizinhos. Fiquei muito doente na infância, hepatite, catapora, sarampo, caxumba, rubéola, e faltava às aulas o tempo todo. No período de resguardo, quando eu já estava bem, os amigos vinham me ensinar as lições que eu havia perdido. Me lembro de seus rostinhos corados, de suas pastinhas com papéis. Me sentia viva no mundo, inteira e agradecida a eles.
E tentava fazer o mesmo, sempre, com quem faltava. Meus pais achavam até que era minha obrigação ir até a casa deles para lhes ensinar o que perderam. E eu ia procurá-los feliz.
Até que um dia bati na porta da casa de uma amiga que faltara alguns dias e ela me recebeu assim: “Legal você ter vindo, mas não veio aqui me passar as lições, veio?”
Meu mundo caiu de verdade. Suspeito que pela primeira vez. Tudo em que eu e meus pais acreditávamos era uma balela pra minha amiga. Uma chateação, um motivo de vergonha.
Isto me distanciou um pouco mais dos outros. Soube que seria sozinha nessa vida, sozinha com o que aprendera. E quando vi o lindo professor sob a chuva, foi primeiro nisso que pensei.