Em entrevista realizada na década de 1970, a cineasta Leni Riefenstahl conta que o ditador nazista usava dublês, amava Hollywood e ganhou de Goebbels, no Natal, animações com o personagem da Disney

em papel do austro-irlandês
Gottfried Helnwein
O jornalista Maximillien Lafayette entrevistou a cineasta e fotógrafa alemã Helene Berta Amalie, conhecida artisticamente por Leni Riefenstahl (1902-2003), em 1972, em Munique. E publicou sua entrevista, sete anos depois, no livro “Últimas palavras de Leni Riefenstahl sobre Hitler, Goebbels, Nazistas e os Judeus”, reeditado em 2014 pela Times Square Press. Durante a entrevista para Lafayette, a diretora que colaborou com Hitler por meio da direção de filmes, entre eles “Olympia” (sobre a Olimpíada de 1936) e “O Triunfo da Vontade” (sobre o congresso do partido nazista,
em 1935), declarou desconhecer os campos de concentração enquanto atuou para o ditador. E ainda sustentou nada ter contra os judeus, que teriam sido trabalhadores, ao lado dela, na realização de seus filmes.

Nesta entrevista, cujos trechos republico aqui, a cineasta elege “A Luz Azul” (“Das Blaue Licht”, 1932) e “O inferno branco de Piz Palu” (Die weiße Hölle vom Piz Palü”, 1929), que dirigiu com G. W. Pabst, seus melhores filmes. E embora o autor do livro em questão garanta ter obtido dela a palavra final sobre sua colaboração com os nazistas, a diretora voltaria ao assunto outras vezes, especialmente em entrevistas para a televisão, jamais renegando a própria obra cinematográfica, mas dizendo ter ignorado as atrocidades contra os judeus. Ela alegava filmar para os nazistas como um meio de posteriormente fazer os próprios filmes. E lembrava que se negou a filmar os combates, ao contrário de outros diretores, por horror à violência nos campos de batalha.


Leni, que dizia nunca ter sido filiada ao partido nazista e que na juventude desejava ter seguido a carreira de dançarina, começou como atriz no cinema depois de sofrer uma contusão. Os filmes que protagonizou e que encantaram Hitler utilizaram-se da dança e de suas qualidades como esportista, especialmente no alpinismo. Era impetuosa, na vida e na arte.


montanhas geladas, entidades
vividas como atriz
Para realizar suas películas como diretora, exigia máquinas e lentes especialmente concebidas para ela, além de uma grande equipe de técnicos excepcionais.
Ela sabia que Hitler a admirava como mulher, mas com o ministro da Propaganda, Josef Goebbels, que ela intitulava “clown intelectual”, suas relações pessoais eram difíceis. Leni o acusava de assediar as mulheres, especialmente as do cinema, apesar de casado com Magda. E dizia jamais ter tido qualquer relação íntima com ele, assim como com Hitler. E talvez por isso Goebbels não a tenha deixado em paz…
Entre as coisas que Leni Riefenstahl afirmou durante a entrevista, algumas o jornalista considerou especialmente “delirantes”:
1.”Hitler tinha muito respeito pelas mulheres. Ele as achava mais criativas que os homens em um nível artístico. Admirava Zarah Leander [atriz e cantora sueca que fez sucesso na Alemanha entre 1936 e 1943], a quem chamava Divina Zarah, o que deixava Josef Goebbels com um pouco de ciúme… Tinha um carinho especial por Magda, a esposa de Goebbels, que considerava a “mais perfeita mulher alemã”; por Eva Braun, com certeza; pela aviadora alemã Hanna Reitsch; pela princesa austríaca Stephanie
Marie von Hohenlohe (ela era judia), a quem deu presentes e um castelo;
e por mim, até certo ponto.”
2. “Josef Goebbels não era um ‘ariano puro’; ele era meio judeu.”
3. “O próprio Hitler tinha algo de judeu em seu sangue. E criou uma nova árvore genealógica apenas para esconder aquele segredo que o perseguira por toda a sua vida. Seu sobrinho, William Patrick Hitler, sabia disso e o chantageava constantemente.”
4.”Hitler e Eva não morreram no bunker em Berlim; eles escaparam com Martin Bormann, dois dias antes de os russos entrarem no bunker. Eu sei disso com certeza. Não sei todos os detalhes, ninguém sabe.”
Leni Riefenstahl explicita a admiração de Hitler por Hollywood, especialmente por filmes com Mickey Mouse, feitos pela Disney. Goebbels, que tratava de incrementar a formação cultural de Hitler, deu-lhe até mesmo animações com o personagem em um Natal… E, entre outras coisas, Leni diz aqui estar certa de que Hitler, a quem de início admirava, pelo que “muito havia feito pela Alemanha”, tinha um ou mais sósias, e que não morreu no bunker, como a História registra.
A seguir, trechos da entrevista.
Maximillien Lafayette: Hitler usava o serviço de sósias?
Leni Riefenstahl: Claro que sim.
ML: Como você soube disso?
LR: Como eu soube disso? Claro que eu soube. Goebbels… Nossa, Goebbels de novo! Sendo uma cineasta conhecida na Alemanha e a diretora favorita de Hitler, e porque trabalhei com Goebbels em dois ou três documentários e alguns filmes, além de conhecer muito sobre maquiagem, o ministro da Propaganda me perguntou sobre as melhores formas ou “técnicas” para disfarçar uma pessoa ou fazê-la parecer outra. E começou a me fazer mais perguntas. Se eu gostava de filmes de Hollywood, se eu gostava de Clark Gable, por exemplo, de outras atrizes… Perguntas como estas.
Hitler era fã de cinema e amava Hollywood. Goebbels criou uma grande cinemateca para ele, porque sabia exatamente de que tipo de filmes gostava e não gostava. Hitler adorava desenhos animados, amava Mickey Mouse. Goebbels deu-lhe uma dúzia de filmes do Mickey como presente de Natal. E criou um departamento especial sobre filmes americanos considerados pró-judeus ou antijudaicos. Pediu-me para ajudá-lo a selecionar alguns desses filmes e eu recusei. Disse a ele que era cineasta, não historiadora do cinema. Então ele me perguntou se eu iria para os Estados Unidos e me encontraria com diretores de cinema em Hollywood para descobrir que tipo de filme eles estavam fazendo sobre Hitler e a Alemanha. E eu disse não. Finalmente, Georg Gyssling (cônsul da Alemanha em Los Angeles) foi escolhido para fazer isso. Gyssling escolheria filmes de Hollywood e os enviaria a Goebbels.

que selecionou filmes de
Hollywood para Goebbels assistir
Você sabe, Goebbels era o responsável pelo cinema alemão durante o Terceiro Reich e ele conhecia muitas atrizes. Não se interessava por atores homens… e uma pergunta levará a outra.
Ele também me questionou sobre o que havia de especial no rosto de Hitler. Eu gostava de seus bigodes? De suas expressões faciais? Adolf Hitler exagerava dramaticamente ao fazer seus discursos? Finalmente me perguntou se com minhas técnicas cinematográficas eu poderia duplicar seu rosto. Se usasse maquiagem de cinema ou de teatro em alguém eu poderia fazê-lo se parecer com Hitler? Fiquei muito surpresa ao ouvir esse tipo de pergunta. Como assim, se eu poderia fazer uma pessoa se parecer com Adolf Hitler? Candidamente, perguntei-lhe se planejava produzir um documentário especial sobre Adolf Hitler ou uma peça de teatro em que uma pessoa devesse se parecer com Adolf Hitler. E ele disse que sim. E eu acreditei nele.
Então Goebbles me perguntou se entre os extras que usei em meus filmes haveria uma pessoa que pudesse atuar muito bem como Hitler e se parecer com ele… até certo ponto. Eu disse que não. Então me perguntou se eu conhecia alguma atriz que se parecesse com Eva Braun. E eu disse que não. Mas sem pensar ou ter qualquer suspeita sobre o que ele me dizia, pensei que o rosto de Eva Braun não seria difícil de duplicar. “Com um maquiador de cinema ou teatro profissional poderia fazer uma atriz se parecer com Eva Braun.” Ele sorriu e disse: “Excelente”. Perguntei quem estava escrevendo o roteiro do filme ou da peça, e Goebbles respondeu: “Eu! Eu quero surpreender o Führer. Vai ser uma boa surpresa. Não diga a ninguém. Isso é um segredo. Você promete?” E eu respondi: “É claro.” Antes de sair, perguntei se poderia ler o roteiro, caso ele estivesse considerando que eu fosse a diretora do filme. E ele respondeu: “Você terá notícias. Mas, lembre-se, é um segredo. Não estrague a surpresa.”
Ele nunca mais me ligou. E eu me esqueci totalmente de tudo isso, até que fui presa e interrogada pelos americanos por horas horríveis e intermináveis sobre se Hitler usava um sósia ou não. E de repente algo passou pela minha cabeça. Algo me atingiu. E eu sabia o que era. Em segundos, lembrei-me de todas aquelas perguntas de Goebbels. O interrogador militar me perguntou: “Adolf Hitler usou um sósia?” Eles repetiram a mesma pergunta duas ou três vezes. Mas eu estava em outro lugar. Foi um pesadelo. Perguntas após perguntas após perguntas, sem parar! Acho que desmaiei.
ML: E agora, depois de todos esses anos, e o que você ouviu e leu sobre o duplo ou os duplos de Hitler, você mudou de ideia?
LR: Sim. Agora tenho certeza. Adolf Hitler usou um sósia.
ML: Leni, por favor, olhe essas duas fotos. Diga-me, esse homem é
Adolf Hitler ou seu sósia?
LR: Este NÃO é Adolf Hitler!! (Leni depois de olhar as fotografias por menos de cinco segundos).

Leni, morto em 1945
ML: Um dublê então?
LR: Sim! Definitivamente um dublê. Oh meu deus, ele se parece exatamente com ele. Mas posso dizer. Não é Adolf Hitler.
ML: Como você sabe?
LR: Primeiro, as orelhas. Essas não são as orelhas de Adolf Hitler. Em segundo lugar, o sorriso, este não é o sorriso de Hitler. O lábio superior… Não, não. Este não é Adolf Hitler. Uma réplica muito boa, um dublê muito convincente! Tirei mais de 3 mil fotos de Adolf Hitler de todos os ângulos. Conheço muito bem a cara dele. Espere um minuto, eu vi essa foto em um noticiário, me lembro agora… É realmente incrível.
ML: E esta fotografia, Leni? Esse homem é Adolf Hitler?
LR: Não! Um duplo! Eu conheço cada centímetro dessa face. Eu o treinei para meu filme “O Triunfo da Vontade”. Eu o dirigi, criei e filmei cenas especiais para se encaixar nas expressões dramáticas de seu rosto. E posso lhe dizer que o homem nesta fotografia não é Adolf Hitler. Este homem é um dublê de Hitler.
ML: Você está me dizendo que na época em que trabalhou ao lado dele nunca soube que tinha um sósia ou suspeitou de alguma coisa sobre isso?
LR: Eu não sabia. Mas suspeitei de algo. Não acho que alguém soubesse naquela época, exceto, é claro, Goebbels, Muller (General Muller), Bormann e o artista da maquiagem.
Este homem (apontando para a foto) ainda está vivo?
ML: Ele foi baleado na cabeça. Assassinado.
LR: Quem atirou na cabeça dele?
ML: Não sabemos. Sem testemunhas. Mas muitos estão apontando o dedo para Martin Bormann.
LR: Eu conheço cada centímetro do rosto de Hitler. E posso dizer que o homem nesta fotografia não é ele. Este homem é um sósia. Você está escrevendo um livro sobre o Terceiro Reich?
ML: Não, não estou trabalhando em um livro. Mas talvez eu possa fazê-lo um dia desses, daqui a alguns anos.
LR: Tenha cuidado. Nunca se atreva a dizer nada de positivo sobre Adolf Hitler. Sem mais comentários.
ML: Por que deveria dizer algo bom sobre Adolf Hitler? Alguns dos meus parentes foram mortos pela SS!!
LR: E se você decidir escrever um livro e publicá-lo em breve, quero ler tudo o que você escreveu sobre mim antes de imprimir o livro. Entendeu? Quero ler e aprovar cada palavra que você escreveu, por favor. Diga a verdade. Não exagere. Não dramatize as coisas. E não me cite mal e não diga mentiras. Não sou Max Schmelling [boxeador alemão que ganhou o campeonato mundial de pesos-pesados em 1930 e 1932], mas vou dar um soco na sua cara o mais forte que puder (sorrindo).
ML: Hitler cometeu muitos erros. Na sua opinião, quais foram os maiores?
LR: Hitler cometeu quatro erros grandes, muito grandes.
O primeiro e maior, como todos sabem, foi o Holocausto Judeu. Poucos tinham conhecimento sobre o assassinato em massa de judeus. Certamente eu não sabia nada sobre essas atrocidades. Hitler nunca me falou sobre os judeus. O segundo grande erro foi sua teimosia. Ele nunca deu ouvidos a seus generais, era um líder civil imponente, mas um péssimo estrategista militar. O terceiro grande erro, claro, foi quando ele declarou guerra à América. E o quarto grande, quando atacou a Rússia. “O duplo de Adolf Hitler decora os membros da organização juvenil nazista de Hitler” Hitler Jugend “do lado de fora do Bunker da Chancelaria em Berlim, em 25 de abril de 1945.”