Um país em porções

Quando eu era criança, uma festa igualitária rolava no rádio. O ouvinte pertencente a qualquer classe social saberia existir naquele momento, fazendo música no Brasil, tanto Chico quanto Caetano, Gonzaguinha quanto Zé Rodrix, Waldyck Soriano e Bethânia, Rita Lee, Raul Seixas, Ivone Lara, Tonico e Tinoco, Originais do Samba, Clara Nunes, Gal, Moraes Moreira, Beth Carvalho, Roberto Ribeiro…

Sabíamos desses e de tantos outros! E o público para cada um e para todos encontrava-se nas intersecções.

Ontem peguei um uber no momento em que o gentil motorista de boné, situado na Band, acompanhava as dez canções mais pedidas do dia. Apurei meus ouvidos e nada. Nunca soube daqueles sucessos, de qualquer banda a interpretá-los, nenhum mísero nome de compositor!

Me dei conta então, dolorosamente, do quanto estamos separados nos últimos anos por esta indústria agro-cultural incessante… A atualidade que ouço, e ouço bastante, não está lá, embora mais que merecesse estar. Ela não entra na Bandeirantes, na rádio popular. Está escondida, sequestrada, inalcançável aos ouvidos gerais.

Somos mesmo um país aos pedaços, servido em porções.