De 12 de outubro de 2015:
Estrada do Cascalho, Boiçucanga. Saio sob a chuva, noite de domingo, atrás de alface e tomate na venda. A caiçara me vê andando, se aproxima, puxa conversa. Diz que não vou encontrar verdura nesse horário, deveria ter ido procurar antes (no que concordo), mas sigo pela estrada a seu lado, quem sabe consiga aquilo de que preciso mais na frente, a conversa é boa. Calculo que ela tenha minha idade, mas descubro que são cinco anos menos.
– Vai chover muito hoje à noite e amanhã também – me informa, sorridente, decidida, camiseta regata, chinelo.
– Ouvi dizer que não… – retruco, chinelo também.
– Vai sim, forte! (Nem choveu, fez sol, tudo bem.) Mas volte, porque o verão vai ser bom – me aconselha, enquanto segura com a mão direita o cabelo solto, que balança.
– Sim, eu sei, venho sempre. Você mora no Cascalho? – pergunto.
– Desde que nasci, é ótimo.
– Eu adoro. Mas tem trabalho por aqui?
– Pra mulher tem.
– Pra mulher?
– Nas pousadas, nas lojas, muita coisa. Mas tem de querer trabalhar. Eu vou de sol a sol.
– Que bacana.
– Tem de aguentar.
– Sim.
– Mas as meninas não estão nem aí. Têm 15 anos, ganham filho, não querem mais saber de fazer as coisas.
– É… Essa geração tem filho cedo…
– Revolta a gente, porque elas pegam vaga na creche, que nunca tem, e ficam pelo dia falando mal das outras, à toa. E tirando a vaga de tanta gente boa que precisa trabalhar.
– Ah… – penso um pouco. – As meninas hoje são diferentes.
– Minha mãe era dura.
– A minha também – me aproximo. – A gente tinha de estudar, não podia pensar em casamento.
– A minha mãe batia com o fio do ferro.
– Mesmo?
– E não deixava estudar. Mulher, não. Só os homens. Tinha de pegar no pesado.
– Ah… – penso em algo, não vem. (Estamos em São Paulo. 2015. Ela é mais nova que eu.) Olha o minimercado aberto, vou entrar, tá? Boa sorte, querida.
– Até!
(Que horas ela volta o quê.)