Outro dia meu filho me levou ao restaurante Syria, na avenida São João.
Caseiro. Comida maravilhosa. A espuma de alho serve de molho. A esfiha achatada, quente, é feita de massa fina recheada.
Fui pagar o que comi no balcão e apareceu a dona, que me lembrou alguém conhecido. Perguntei-lhe de onde ela era. “Damasco”, respondeu.
Aproveitei para lhe dizer que meu avô materno nasceu em Malula, uma linda cidade terrosa, cheia de montanhas, em que grutas escondem igrejas.
Ela sorriu. E, com o sorriso, rejuvenesceu. Era mesmo uma das minhas.
Malula, contou, é “o interior de Damasco”. Um povoado tão maravilhoso como outros (me disse seus nomes, creio que em aramaico, mas eu não os conhecia).
Mostrou-me seu filho ruivo de cabelos crespos, como os do meu avô. O jovem distante, sentado à mesa do restaurante, não falava português. Nem língua alguma, naquele momento. Em lugar disso, quieto, olhava pela janela o movimento da São João. Tinha seus 26.
“Eu cheguei a São Paulo faz três anos, ele finalmente veio agora”, ela me contou, alegre, no seu português que mal usava verbos.
“Ele fica aqui ou volta?” – perguntei.
“Aqui.”
“Não tem família em Damasco?” – insisti.
“Não tem mais Damasco”, ela então me respondeu. “Não tem mais Malula”, sorriu. “Síria não tem”.
Era como se houvesse arremessado pedras no meu rosto. Mas eu não perdi a linha. Raramente perco.
E sorri também.
Até porque não convinha lhe contar o que sei.
“Não tem mais Brasil, senhora.
Não tem país”.
Tenho a mesmíssima sensação, queri. Cabô.
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sim… tão difícil.
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