Um homem em estado interessante

A comédia de 1973, exibida na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, recupera a suavidade demolidora do diretor francês Jacques Demy

Catherine Deneuve e Marcello Mastroianni,
grandeza que bem se vê

Curioso que a historiografia ocidental tenha colocado o diretor francês Jacques Demy (1931-1990) em um pé de página. Percorro rapidamente a biblioteca aqui de casa e constato a indiferença e o não-me-toques dos livros que o desprezam: o diretor Jean-Luc Godard o menciona como amigo em um poema, e fica por isso; os estudiosos de Éric Rohmer pedem o favor de não confundirem seu maravilhoso diretor com o outro; a crítica Pauline Kael sentencia que Demy fez tudo errado ao produzir um musical estático, inspirado nos estadunidenses, em seu clássico “Os guarda-chuvas do amor”. Não há créditos para Demy, ou todos eles foram usados para o bem unicamente por Agnès Varda, a viúva que o cultivou e o filmou nos últimos dias, tendo renascido ela mesma como estrela após sua morte e se tornado um justo objeto de culto atual.

Mais curioso ainda é que isto aconteça mesmo Demy não aparentando longinquamente ser demi, ser metade. E o que dizer daquele um quinto em que o confinaram? “Um homem em estado interessante” (1973) prova que meteram o diretor no lugar errado. Comédia não é algo simples de ser feito, ainda mais quando parece simples de ser vista – simples e louca -, além disso contestadora do estado de coisas. No caso, aqui, quase imbatível quando mistura uma rara leveza cômica com a substância, com o peso de uma argumentação reflexiva.

Grande Catherine: terá sido
cabeleireira a vida inteira?

Em “Um homem em estado interessante” muitos universos cinematográficos se cruzam, da estranheza onírica assimilada como norma, originada em Luis Buñuel, ao desfilar do absurdo maquinário das ideias contemporâneas, na trilha de Jacques Tati. Demy é um demolidor suave. Para ele, neste filme, a confusão do Ocidente, sua grande ironia, está em determinar que toda fumaça de transformação possa sugerir a existência de um próximo passo, um fogo revolucionário (cinco anos se passaram desde 1968), embora essa rebeldia vá resultar no apagamento de sempre, o do consumo que destrói coisas belas. Ah, como é dolorosamente risível viver no capitalismo!

Marcello Mastroianni – há sempre Marcello nos tantos outros que interpreta – encarna o dono de uma auto-escola mal-sucedida em seu fundamento, o de ensinar os alunos a dirigir. Sua esposa, Catherine Deneuve, não é esposa, embora mãe de seu filho, uma cabeleireira com sonhos de subúrbio (e que grande atriz: terá nos enganado o tempo todo e sido cabeleireira a vida inteira?). Do nada Marcello começa a enjoar e sua barriga cresce demais, o que leva grandes especialistas médicos (uns empolados fumantes professorais) a constatarem que engravidou. 

Em “Um homem em estado interessante”,
a evocação de aspectos de uma vida a dois

Um parênteses aqui é que Demy parece evocar diretamente os atores Catherine e Marcello, na época pais de uma menina, mas nunca casados, no seu filme. O diretor Mario Monicelli ria ao contar que Marcello às vezes viajava no fim de semana para a Itália de modo a trazer um prato de comida como presente para Catherine, na França. Um prato de comida! Para Catherine! E então a barriga de Mastroianni passa a fazer mais sentido…

O fato é que a narrativa de Demy parte da conclusão médica para sua exploração pela imprensa (dos noticiários aos risíveis debates), pela publicidade e pelo próprio casal, feliz por negociar a um preço alto a novidade a lhes ocorrer, que, embora equiparável à descida do homem na Lua, nasceu, segundo um especialista, do consumo excessivo de alimentos processados com hormônios. O filme debocha de maneira avant-garde da condição de um homem grávido: logo o aborto será decretado uma normalidade indispensável, dizem as clientes do salão de beleza de Catherine…

Todo o cenário de cores vivas, o entorno urbano frenético, os pobres, os esnobes, os atores, os ricos, tudo neste filme fala e se agita, compondo um vigoroso painel documental de um tempo e de um lugar. Meus vivas inteiros para Demy, que após a sessão de cinema me fez ver com seus olhos a loucura da cidade onde vivo.

O diretor Jacques Demy, suave demolidor

Na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Sessões no Espaço Augusta 2, 19h40 do dia 24, e no Espaço Augusta 1, às 15h50 do dia 28.

Marcello mio

O filme de Christophe Honoré presente na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo viaja pelo reencontro de Chiara Mastroianni com a figura de seu pai

Chiara, a “Polpetta” do pai

Para os cinéfilos das celebridades europeias, parece ser motivo de curiosidade e admiração o fato de Chiara Mastroianni ter abraçado a profissão dos pais. Sabemos que Catherine Deneuve e Marcello Mastroianni não são atores quaisquer, que flutuam na poeira de estrelas e que talvez tenham reinventado o cinema. Então, por que sua filha se aventuraria nessa direção, certa de que não poderia repeti-los? 

Isto, este longa ficcional não vai nos explicar. Mas a doce e leve Chiara quer nos fazer crer que, aos 52 anos, ainda busca a si mesma e que essa procura envolve bastante coisa – memória, convicções, história, psicologia – amarrada em névoa musical pelo diretor Christophe Honoré. 

A mãe Catherine, intensa presença

A mãe Catherine, viva, pulsante, opina sem dó em sua vida. Eis alguém presente, e pelo jeito não apenas no elenco deste filme, a ressaltar a brevidade de tudo. Pena que o pai se foi. Chiara, que muito sente sua falta, resolve reencarná-lo para suprir uma ausência que não aflige somente a ela, mas a todos ao redor. E também porque, atriz consolidada, ainda reclamam que ela seja um pouco daquilo que ele foi. Ser Marcello, por assim dizer, vai auxiliar seu reencontro consigo mesma – ela tão francesa, ao contrário do pai.

O filme, portanto, é muito mais “Chiara, io” que “Marcello mio”. Nesse caminho, a “Polpetta”, como a chamava o pai, vai penar. Ela o ressuscita em seus figurinos célebres, no rosto tão semelhante, nos gestos e encantos. Sabemos que não fala como ele, não apenas porque seu italiano é afrancesado. Não fala como ele porque não faz suas circunvoluções verbais, não tem o pensamento no ar. Mas algo de sua ironia, de sua leveza, de um erotismo que quer esconder-se, isso ela possui. Como ele, pode cantar acompanhada por um cão…

A face que é espelho

No périplo que é essa espécie de versão de Chiara para “Oito e meio”, ela vai encontrar os intensos amigos, o ex-marido Melvil Poupaud, por exemplo, que contracenara ao seu lado e de seu pai em “Três vidas & uma só morte”, dirigido por Raúl Ruiz (de 1996, penúltimo filme em que Mastroianni atuou, também presente na mostra) e os grandes do cinema, como a atriz Stefania Sandrelli, que atuou ao lado de Marcello em “Divórcio à italiana”, de Pietro Germi (1961). Eles ora aconselharão Chiara, ora a apoiarão ou a deixarão saber quão fantasmagórica se tornou ao encarnar o pai.

Hora de evocar “A Doce Vida”

“Marcello mio” evoca “A Doce Vida”, “Noites Brancas”, “Ginger e Fred” e “Dois Destinos”, entre outras obras de que ele participou. Especialmente, de maneira afrouxada, deixa-nos navegar pelas entrelinhas da vida familiar. Descobrimos assim que Catherine desconfiava muito de Marcello, de sua infidelidade pela noite, embora os dois nunca tivessem se casado. Ela esteve quase certa de que Marcello pegou Maria Callas quando o casal morava, com a filha, no andar acima daquele apartamento habitado pela cantora, em Paris…

O filme transcorre entre a representação de coisas como essas, mais ou menos pequenas, uma delas especialmente carinhosa: o ator adorava patinação e assistia ao lado da filha, pela tevê, aos torneios do esporte, duvidoso dos juízes. Saímos do filme convencidos de que Marcello era uma criança também, eterno para Chiara como para nós.

O diretor Christophe Honoré

Na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. Sessões no Cinesystem Frei Caneca 2 (17h do dia 22), Espaço Augusta sala 1 (19h30 do dia 23) e no Cinesystem Frei Caneca 1 (13h do dia 25).

Um festival de mulheres em “As Bruxas do Oriente”

Julien Faraut conta como dirigiu este filme espetacular, em cartaz na 45ª Mostra Internacional de Cinema, a partir da arte de uma documentarista e de uma desenhista de anime dos anos 1960, junto ao depoimento das ex-atletas

As Bruxas do Oriente, time nacional de vôlei do Japão, partem para vencer as soviéticas em 1964, na Olimpíada de Tóquio

O francês Julien Faraut, de 43 anos, é um eterno satisfeito com o cinema. Dentro dele, ao contrário do que ocorreu com a maioria de seus antecessores e contemporâneos, pode fazer o que quiser, no tempo que desejar. Para chegar a este ponto, contudo, ele teve antes de subir degraus no Instituto Francês de Esportes, o Insep, a “fábrica” de campeões olímpicos situada no coração da Floresta de Vincennes, na região sudeste de Paris, onde numa gigantesca área de 28 hectares a entidade acolhe e prepara diversas gerações de esportistas de alto nível. Ali, Faraut cuidou de coleções de filmes e recuperou filmagens antigas. Desse trabalho de quinze anos, o mestre em história pela Universidade Paris-Nanterre extraiu uma possibilidade: construir filmes a partir de outros.

As Bruxas do Oriente é, como tudo em sua carreira, um filme a partir de outras filmagens do esporte. Especialmente de um desses documentários, O preço da vitória, dirigido em 1964 pela cineasta e atriz japonesa nascida na China Nobuko Shibuya (1932-2016). O filme fez Faraut literalmente pirar. Nesta obra-prima de luz e angulação, exibida no Festival de Cannes de 1964, Shibuya apresentava o time de voleibol feminino de uma fábrica de tecelagem. Treinada por Hirofumi “Demon” Daimatsu, que instruía as jogadoras com rigor, especialmente na arte de rolar na quadra, a equipe foi a escolhida, em 1960, a representar o país no campeonato mundial do Rio. E apenas perdeu para as soviéticas na final. Depois disso, o time seguiu em turnê pela Europa e em 1964 vingou-se do time da URSS, levando a medalha de ouro sobre ele na Olimpíada de Tóquio.

O filme de Faraut foi feito a partir da montagem dessas filmagens e do anime Ataque número 1, da artista japonesa de 75 anos Chikako Urano, que acompanhou o sucesso das chamadas bruxas nos anos 1960. Duas mulheres, portanto, a servir como inspiração a este criador… Além das filmagens de época, Faraut conseguiu reunir as próprias jogadoras seis décadas depois do sucesso. Foi a primeira vez que tiveram a chance de expor em filme as histórias que circundaram seu feito.

A diretora Nobuko Shibuya (esq.) e a autora de mangá Chikako Urano, cujo trabalho foi reaproveitado por Julien Faraut em seu filme sobre a trajetória das Bruxas

Segundo Faraut, a história do treinador, por seu lado, foi suficientemente contada no Japão, e para além do voleibol de fábrica. Convocado pelo exército japonês durante a Segunda Guerra, Daimatsu se viu no meio da desastrosa campanha na Birmânia. Um dos poucos sobreviventes, fez o seu caminho ao longo da “estrada dos ossos brancos” de volta à Tailândia e à vida no pós-guerra. Apesar do rigor que impunha aos treinamentos das jogadoras de voleibol, ele falava com suavidade e era calmo. Fumante inveterado, morreu 14 anos após a vitória em Tóquio.

Tudo em As Bruxas do Oriente caminha bem. A edição é especialíssima, interessada no crescendo emotivo. E assim segue o padrão visual do longa, cuja direção de arte acerta o tempo todo ao nivelar as diferenças entre animação e filme, e provocando incessante diálogo entre elas. Isto sem mencionar que o assunto sugere na medida paralelismos e metáforas de conquista pessoal a partir dos depoimentos das ex-jogadoras.

A seguir, a entrevista que fiz com o diretor Julien Faraut.

O diretor francês Julien Faraut, também autor de “John McEnroe no reino da perfeição”, de 2018

Gostaria de entender seu trabalho há 15 anos no Instituto Desportivo Francês, o Insep. Sempre atuou para eles como cineasta? Ou era pesquisador, roteirista, diretor de fotografia, editor? Os filmes para o instituto são destinados ao cinema, à televisão ou a ambos?

Quando jovem adulto, eu era um cinéfilo, mas jamais imaginei que um dia dirigiria filmes! Descobri o documentário e, sobretudo, encontrei rolos de filme na universidade (Paris X Nanterre) que me despertaram para as possibilidades de fazer meu próprio cinema. Em 2001, tive a oportunidade de estagiar no Insep, onde cuidei das coleções de filmes. A partir deste período, comecei a editar e reutilizar as filmagens dessa pequena biblioteca e mostrar seus itens desconhecidos.

Sou responsável pela cinemateca do Insep desde 2003. Os primeiros filmes foram feitos para uso interno, apenas dentro do instituto. Depois comecei a dirigir para museus, eventos especiais ou festivais. Com o tempo, esse trabalho foi se tornando mais importante, mais “profissional”. Comecei a atuar junto a uma produtora e dessa colaboração nasceu Um novo olhar para Olympia 52, transmitido pela TV francesa em 2013. Os dois filmes seguintes (John McEnroe no reino da perfeição, de 2018, presente na 42 Mostra, e As bruxas do Oriente) foram produzidos pela UFO Production e lançados nos cinemas. Ainda é uma forma de mostrar a biblioteca de filmes, e ainda os uso para palestras ministradas dentro do instituto.

Toda a atenção do Japão para o que uma mulher era capaz de fazer

Como nasceu “As Bruxas do Oriente”? Você já conhecia esse assunto e decidiu dirigir um filme sobre ele? Ou o trabalho começou quando encontrou os documentários japoneses que descreviam a história dos atletas? Quantos anos você passou fazendo este filme?

Como em qualquer um dos meus filmes anteriores, descobri a história das Bruxas por meio de uma filmagem. Há dez anos, uma treinadora francesa de vôlei (que comandava a seleção nacional de vôlei feminino na década de 1980) me procurou com um filme de 16mm produzido pelos japoneses e destinado a ensinar técnica às jogadoras. Essa filmagem do treinamento das Bruxas me deixou maravilhado. Me fez lembrar de um anime japonês a que assistia quando criança! Comecei a pesquisar e minha vontade de fazer um filme sobre a história se confirmou. É difícil dizer quanto tempo levei para fazer o longa. Eu diria dois anos. E mais alguns anos para conceber o projeto.

O material histórico deste filme tem uma fotografia impressionante. Foi preciso restaurá-lo? Você conseguiu entrar em contato com as equipes de filmagem originais?

Trabalhar numa cinemateca me deu alguns conhecimentos sobre os diferentes materiais, suporte e formato dos filmes. Dou o melhor de mim para procurar as impressões dos negativos originais e peço uma digitalização 4K. Fizemos algumas gradações de cor, mas nenhuma restauração foi necessária. Nobuko Shibuya, que dirigiu o maravilhoso filme O preço da vitória (com a sessão de treinos das Bruxas na fábrica), infelizmente faleceu. Pensei em entrar em contato com Chikako Urano, a autora do mangá Ataque nº 1, mas finalmente não o fiz. É preciso fazer algumas escolhas!

Seu filme não nos mostra o jogo em que o time japonês perdeu para a URSS durante o campeonato mundial sediado no Rio de Janeiro, em 1960. Existem imagens dessa partida? 

Não encontrei nenhuma filmagem deste evento. Solicitei aos arquivos nacionais do Brasil algum noticiário ou filmagem, mas eles não encontraram nada.

Foi difícil reunir as jogadoras para falar sobre esse passado? Elas fizeram alguma exigência preliminar para dar seu depoimento?

Demoramos quase um ano para conseguir encontrá-las. Comecei do zero, pois não tinha vínculo qualquer com os japoneses. Então nós (eu e meu produtor) mandamos garrafas no mar… Uma pessoa na UniFrance finalmente nos deu o contato de alguém que, envolvido nas Olimpíadas de Tóquio 2020, comunicava-se com elas. Meu tradutor foi muito útil e convincente. Também éramos cautelosos, com a preocupação constante em sermos educados e respeitosos. Elas aceitaram falar assim que entenderam nosso pedido.

A montagem deste filme é primorosa, assim como a direção de arte. Quais foram as principais dificuldades que você enfrentou para criar este padrão visual? Sua maneira de fazer a edição atinge o espectador em cheio, ele passa a torcer por elas. A identificação do espectador é uma busca importante em seu trabalho?

Eu tenho de ser o primeiro a me satisfazer com a edição. Como primeiro espectador do meu filme, quero gostar dele. Posso gastar o tempo que for preciso para editar. Nunca trabalho com prazo curto ou comando. Amo editar e fazer filmes. Estou feliz que você tenha sentido prazer em ver o filme.

Os documentaristas japoneses alguma vez entrevistaram essas jogadoras? Ou seu discurso foi simplesmente ignorado pelos filmes da época?

O técnico Daimatsu e a capitã Kasai eram as duas vozes a falar em nome da equipe. Algumas jogadoras só deram entrevistas muito breves depois que os dois faleceram. Encontrei uma verdadeira ausência de testemunhos.

Você construiu um excelente perfil psicológico do Demon Daimatsu. Mostrou-o como um inovador muito exigente, mas também atencioso com suas jogadoras, que por sua vez pareciam adorá-lo. Ou alguma delas rompeu relações com ele em determinado momento?

Todos as jogadoras que conheci me disseram quão sinceramente se sentiam gratas a ele. Foram realmente muito próximas a Daimatsu. Suas conquistas e trajetória comum criaram laços muito fortes.

Sentimos a ausência da voz do técnico no filme. Não houve entrevistas filmadas que você poderia ter usado neste filme? 

Eu não encontrei esse tipo de filmagem de Daimatsu. Talvez não tenha procurado muito. Ele não era meu alvo. Eu estava focado nas jogadoras, aquelas de quem não tínhamos notícias. Era a elas que eu queria dedicar todo o meu filme.

O técnico “Demon” Daimatsu, sem perder a ternura jamais, e suas jogadoras

Não teve vontade de alongar um pouco mais a trajetória do treinador no seu filme? Você acha que isso desviaria o espectador do objetivo principal? Senti uma curiosidade insatisfeita sobre o que ele fazia antes de trabalhar para a equipe de fábrica e depois que suas jogadoras venceram a Olimpíada.

Eu posso entender sua curiosidade. Daimatsu escreveu vários livros sobre sua história, método e carreira. Sua vida e ponto de vista foram bem documentados. Meu objetivo neste filme foi focar nas jogadoras apenas porque elas não tiveram a oportunidade de falar por si próprias. Daimatsu, Kasai, jornalistas e observadores falavam em nome delas. Desta vez, quis lhes dar a oportunidade de expor seus pontos de vista e sentimentos.

Quanto lhe encanta o cinema japonês? Algum dos cineastas do país influenciou sua carreira como diretor?

Gosto de cinema japonês e de anime com certeza. Mas esse cinema não me influenciou direta ou conscientemente. O cineasta francês Chris Marker (1921-2012), que desempenhou um papel importante na maneira como comecei a fazer filmes, era um amante do Japão. Seu filme Sunless (1983), parcialmente localizado no país, é muito importante para mim. Mas ainda não exerceu nenhuma influência direta na maneira como dirigi As Bruxas do Oriente. Segui o caminho das filmagens de origem, o testemunho das jogadoras e resolvi problemas técnicos. O estilo do filme não seguiu nenhuma ideia anterior ou fixa. Gosto de fazer filmes que encontrem estilo no processo de fazer. “Naturalmente”, se você quiser assim. A forma tem de servir e se adequar ao assunto, em minha opinião.

Quais são as suas principais influências cinematográficas, principalmente no campo do cinema esportivo? Como você vê o trabalho de Leni Riefenstahl em Olympia?

Mencionei o Marker como uma grande influência. O trabalho de Riefenstahl era visualmente muito sofisticado e inovador. Ela teve muitos apoios e fundos para fazer seu filme. Eu pertenço ao mundo indie do cinema. Não sinto nenhuma conexão pessoal com ela, na verdade.

Você acredita que sempre será um diretor de temas esportivos? Ou pretende fazer documentários sobre outros temas ou mesmo ficção?

Nossas vidas são feitas de oportunidades. Quando comecei a dirigir a cinemateca do Insep, encontrei lá a oportunidade de fazer filmes de fundo. Não vejo o “tema esportivo” como uma limitação. Não me sinto frustrado com isso. O tema de um filme não faz todo o filme, o cinema sim é importante. A forma e a narração de um filme importam. Temas esportivos me deram boas oportunidades até agora. Eu me diverti muito. É também um território totalmente desconhecido, uma chance para qualquer cineasta que queira criar sua própria obra. Se lhe dão a oportunidade de fazer uma ficção… por que não?

Você pode nos dizer qual será o seu próximo projeto de filme?

Estou começando a pensar em um novo assunto, mas ainda não sei se conseguiria fazer um filme com ele. Preciso trabalhar nisso ainda, desculpe! Seria sobre um tópico de esporte também, mas um tópico muito incomum.

AS BRUXAS DO ORIENTE

França

Direção Julien Faraut

Documentário

2021 cor & pb 100 min.



TRAILER: https://www.youtube.com/watch?v=np232nnEmvQ