O filme de Larry Clark e a recordação de uns pivas de moreiras

Quando um amigo como Wesley Pereira de Castro sugere, não evito.
E não havia motivo qualquer pra repúdio, porque amo Larry Clark desde sua fotografia.
O livro “Tulsa”, de 1971, com o balé das seringas, a morte e o enterro da criança ao fim, não me abandona.
Que história.
Que difícil é ele por nos perguntar quem somos, e o que fizemos de nós, com a beleza intensa que atrai…

“O Cheiro da Gente”, seu filme de 2014, que meu amigo indicou e eu vi ontem, toca no barroco da gente.
Mais uma vez, um filme sobre a juventude.
O chão sujo para as faces dos anjos.
O jovem que literalmente tripudia sobre o corpo velho que lhe dá sustento, depois de amarrá-lo a uma teia de dor…

O corpo que se prende em sacrifício à desilusão, aos homens, às garrafas, ao cheiro da rua!
Com um ritmo e um movimento cinematográficos de prender nossas vidas a um instante.

São skatistas e garotos de programa na via bonita da cidade.
Como acontece na praça Ramos daqui.
Os mesmos volteios das esculturas.
E os skatistas desligados dos pedestres.

Um deles, aqui em São Paulo, machucou ainda mais o pé que me atormenta, e eu o perdoei…
O que eu fazia lá, atravessando a rua?
Por que a julguei minha?
Ele segurou meu corpo com um dos braços fortes para impedir a face triste de ir ao chão.

Olhei ao redor me perguntando por onde vagaria o Roberto Piva dos adolescentes rubros…
Ou o Carlos Moreira do meu coração nos cinemas que insistiam em existir na Dom José de Barros…
Os meninos de “O Cheiro da Gente” são tanto do que sou.
Dos desencontros e do amor.
Mas estou viva!
Viva, Piva!

Um filme, mas também uma narrativa na sucessão de “Lamentação sobre o Cristo morto”, de Andrea Mantegna, e “Mamma Roma”, de Pasolini.
